Alergia
Alergia
A dermatite atópica é uma doença inflamatória crônica da pele, mediada por mecanismos imunológicos, de causa multifatorial, mas com um componente genético muito importante que leva a lesões da pele e coceira. Na maioria das vezes, os pacientes com dermatite atópica apresentam antecedente pessoal ou familiar de alergia, podendo estar associada principalmente à asma e rinite alérgica.
Ela afeta de 10% a 20% das crianças em idade escolar. Embora possa aparecer em qualquer idade é mais prevalente em bebês e crianças, aparecendo antes dos 5 anos de vida em 70% a 90% dos casos. A dermatite atópica assume forma leve em 80% das crianças acometidas e em 70% dos casos há melhora gradual até o final da infância. Quanto mais precoce o início da doença (menores de 1 ano de vida) maior a chance de melhora.
Atualmente, existem duas hipóteses que tentam explicar o desenvolvimento da dermatite atópica. Na primeira, chamada de fora para dentro (outside-inside), a dermatite atópica seria produzida primariamente por uma disfunção de barreira da pele. Na segunda, de dentro para fora (inside-outside), seria produzida primariamente por uma alteração imune que desencadearia uma resposta inflamatória contra irritantes e alérgenos ambientais. É provável que todos os pacientes apresentem uma combinação de desregulação imunológica e disfunção da barreira da pele e que ambas as hipóteses, de fora para dentro e de dentro para fora, sejam relevantes em diferentes subgrupos de pacientes.
A apresentação clínica da dermatite atópica varia desde formas localizadas e leves até formas disseminadas e graves. As principais manifestações clínicas são coceira, pele seca e o eczema, que pode ter períodos de melhora e piora ou ser crônico, com distribuição e características variáveis conforme a idade.
O eczema é definido como uma inflamação da pele, podendo apresentar as seguintes características: eritema (hiperemia), pápulas (lesões elevadas), vesículas (pequenas bolhas), escamas, crostas e liquenificação (pele espessa e mais rígida). As características e localização do eczema variam de acordo com a idade do paciente, sendo dividido em fase infantil, pré-puberal e adulta.
O diagnóstico de dermatite atópica é baseado na história clínica, exame físico e exames complementares. As características das lesões, cronicidade, recidivas, o aspecto de distribuição das lesões, a idade do paciente e o comprometimento da qualidade de vida do paciente são importantes para a classificação da gravidade da doença e da conduta terapêutica.
A realização de exames auxilia na identificação de possíveis alérgenos e avaliação do sistema imunológico, sendo necessário essencial nas formas moderadas e graves de dermatite atópica. Entre os principais exames para uma investigação inicial destacam-se:
Hidratação da pele
Preserva a hidratação da pele e mantém a integridade da barreira cutânea restaurada. São a primeira linha de tratamento, recomendados para todas as formas da doença.
Uso de hidratantes de forma adequada diminui o número de crises agudas, melhora o ressecamento, o prurido e pode diminuir o uso de corticoides tópicos.
Para que a pele fique hidratada são necessárias, no mínimo, duas aplicações diárias do hidratante, de forma que cubra toda a pele do corpo e em quantidades adequadas.
A escolha do hidratante deve ser individualizada, mas os desenvolvidos especificamente para a dermatite atópica são os mais indicados, pois contêm substâncias com ação emoliente, princípios ativos e componentes que se encontram diminuídos na pele da criança com dermatite atópica, como ceramidas, glicerina, ácidos graxos e ésteres de colesterol.
Novos hidratantes que contêm novos princípios ativos capazes de restituir as funções da barreira cutânea ou que modificam o microbioma têm sido desenvolvidos, tais ativos incluem os lisados de Aquaphilus dolomiae ou Vitreoscilla filiformis.
Evitar hidratantes que contêm alérgenos como amendoim, leite ou trigo, sobretudo em pacientes menores de dois anos.
Hidratantes com lactato de amônio e a ureia em altas concentrações podem causar irritação na pele do paciente com dermatite atópica e devem ser evitados durante as crises.
Óleo de semente de girassol purificado melhora a barreira cutânea na dermatite atópica, enquanto o óleo de oliva e o óleo de semente de mostarda são prejudiciais para a reparação da barreira cutânea e podem causar eritema.
Controle dos agentes infecciosos
Pode ser necessária a utilização de antibióticos tópicos ou orais para controle das infecções secundárias, já que a presença de infecção, principalmente por staphylococcus aureus, pode levar à exacerbação da doença.
Controle dos alérgenos alimentares
Dieta de exclusão do alérgeno alimentar quando comprovada sua relação clínica com a doença através do teste de provocação oral, devendo ser orientada pelo médico e pelo nutricionista, para que sejam feitas as substituições nutricionais adequadas daquele alimento.
Controle dos aero alérgenos
Para diminuir a exposição aos aero alérgenos (ácaros), feito através das medidas de controle ambiental.
Controle de agentes irritantes
As roupas devem ser leves e as fibras das roupas ideais são macias e de algodão por seu efeito mecânico de menor irritação. Retirar etiquetas das roupas. Devem ser evitados tecidos ásperos, de lã e materiais sintéticos em contato com a pele. Roupas quentes e oclusivas também podem levar a sudorese excessiva e piora do prurido, assim como ambientes muito quentes. Usar detergentes ou sabões líquidos e com pH neutro para lavar roupas. Roupas novas devem ser lavadas antes do uso a fim de reduzir a concentração de formaldeído e outras substâncias potencialmente irritantes.
Controle de fatores psicológicos e emocionais
Sabemos que o componente emocional e psicológico é muito importante no desencadeamento do prurido no paciente com dermatite atópica, além da própria doença poder levar a uma má qualidade de sono, irritabilidade, mal desempenho escolar e no trabalho, problemas de baixa autoestima e dificuldades no convívio social. Por esses motivos muitas vezes é necessário o acompanhamento com psicólogo.
São agentes anti-inflamatórios e controlam os principais sintomas da dermatite atópica, como o prurido e as lesões eczematosas. Atualmente os consensos seguem a alternativa de utilizar corticosteroides de maior potência por curtos períodos, seguidos por compostos de menor potência por períodos mais longos.
Os corticosteroides estão indicados assim que a lesão inicia, ou seja, de forma reativa nas crises e as evidências sugerem que a aplicação uma vez ao dia de alguns compostos é tão eficiente quanto a de duas vezes ao dia, sendo que atualmente as novas formulações recomendam apenas uma aplicação diária. O tempo de uso recomendado nas crises é até que ocorra melhora significativa da lesão e redução da sua espessura. Para isso, podem ser necessários dias ou até semanas.
O uso de corticosteroides na terapia proativa (aplicar duas vezes por semana nas áreas que ocorrem lesão, mesmo quando ainda não existe lesão ativa) mostrou-se eficiente em reduzir as crises, diminuir a gravidade da doença e reduzir a produção de IgE contra aero alérgenos, podendo ser uma opção para os pacientes com crises frequentes. Porém podem apresentar efeitos colaterais caso haja uso inadequado da medicação, como: atrofia cutânea, estrias, alterações da pigmentação, fragilidade vascular resultando em telangiectasias e erupção acneiforme. Alguns destes efeitos colaterais podem ser permanentes. Efeitos sistêmicos, como supressão do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, são raramente descritos, mas podem ocorrer quando são utilizados corticosteroides tópicos em áreas extensas por períodos prolongados ou corticosteroides de alta potência sob oclusão. Por isso, a indicação do uso de corticoide tópico deve ser sempre orientada por um médico e nunca de forma indiscriminada.
Exemplos: corticoides tópicos de alta potência: clobetasol e betametasona; corticoides tópicos de média potência: mometasona, desonida, fluocinolona; corticoides tópicos de baixa potência: hidrocortisona e dexametasona.
Os inibidores da calcineurina são uma classe de medicamentos utilizados nas crises para o controle da inflamação na dermatite atópica. Estão disponíveis dois inibidores tópicos de calcineurina: o pimecrolimo e o tacrolimo. No Brasil, o pimecrolimo pode ser indicado a partir dos três meses de idade e com única apresentação em creme na concentração de 1 %. O tacrolimo é indicado a partir dos dois anos de idade, com apresentações em pomada 0,03% (uso pediátrico) e 0,1% (uso em maiores de 16 anos). Como não apresentam os mesmos efeitos colaterais que os corticoides tópicos, podem ser utilizados com maior segurança na face, nos genitais e nas áreas próximas a mucosas. São apontados como tratamento de primeira escolha em pacientes com lesões de pálpebra.
Utilizados para auxiliar no controle do prurido. Existem os anti-alérgicos de primeira geração( hidroxizine, dexclorfeniramina), utilizados quando se deseja um efeito sedativo para melhorar a qualidade do sono do paciente evitando a coceira durante o sono, e os anti-histamínicos de segunda geração( fexofenadina, desloratdina, levocetirizina) que não causam sonolência. Muitas vezes é necessário a associação de ambos.
É um imunossupressor que inibe as vias dependentes da calcineurina, resultando em níveis reduzidos de várias citocinas pró-inflamatórias. É uma droga eficaz, utilizada nos casos de dermatite atópica moderada a grave, tanto em crianças como em adultos, em que a terapêutica convencional foi ineficaz ou inapropriada. Por ser uma droga imunossupressora é necessário um monitoramento frequente do paciente principalmente da função renal e da pressão arterial e, havendo alterações laboratoriais ou aumento da pressão arterial, a ciclosporina deve ser interrompida ou sua dose reduzida. O tempo de tratamento deve ser de 3 meses a um ano e, em crianças, deve considerar-se que as vacinas podem não ser eficazes durante o seu uso, decorrente da imunossupressão.
Apesar do uso frequente na prática clínica, a corticoterapia sistêmica no tratamento da dermatite atópica é limitada pelos conhecidos efeitos colaterais e escassez de estudos controlados em longo prazo em adultos e crianças. Desse modo, seu uso deve ser extremamente cauteloso e restrito a casos excepcionais. Alguns pacientes podem se beneficiar de cursos rápidos de corticoides sistêmicos nas agudizações graves, entretanto a melhora clínica é frequentemente associada à recorrência dos sintomas após a retirada da medicação (efeito rebote), resultando em casos de difícil controle. O uso frequente do corticosteroide oral implica na instituição de outras terapias imunossupressoras para evitar a necessidade de seu uso.
Principalmente UVB-NB (banda estreita). A utilização de radiação ultravioleta com fins terapêuticos é antiga na medicina, especialmente para dermatoses inflamatórias, como psoríase e vitiligo. A utilização como adjuvante no tratamento da dermatite é mais recente, mas já consagrada na literatura.
No controle da dermatite atópica, a fototerapia é boa opção terapêutica para melhorar as lesões de pele, prurido e alterações do sono, com períodos de remissão prolongados de até seis meses e sem efeitos adversos sérios. Especificamente na terapêutica da dermatite atópica, os espectros mais empregados são UV-NB (banda estreita, de “narrow band”) e UVA-1.
O UVA-1 é principalmente indicado em casos moderados a graves com lesões agudas ou subagudas. O método pode ser usado tanto em crianças como adultos, sendo os tempos de exposição longos. As limitações ao uso do UVA-1 são de custo mais elevado e a necessidade de três a cinco sessões por semana. Já o UVB-NB é indicado para casos crônicos, com lesões liquenificadas e não muito espessas. Também constitui atualmente método de escolha na transição de tratamentos imunossupressores sistêmicos, como ciclosporina ou metotrexato para os tópicos. No entanto, devemos evitar usar a fototerapia em conjunto com estas drogas.
Em conclusão, a fototerapia pode melhorar ou mesmo clarear as lesões da dermatite atópica, diminuir a colonização bacteriana e reduzir a necessidade e potência dos corticosteroides tópicos, mas os efeitos benéficos variam de paciente a paciente.
É um imunobiológico que inibe a ação de substâncias inflamatórias que tem importante papel na patogênese da dermatite atópica (as interleucinas 4 e 13). Os imunobiológicos são uma classe de agentes farmacológicos montados por engenharia genética e dirigidos para os mediadores da inflamação alérgica. Recentemente, múltiplos ensaios clínicos estão demonstrando a eficácia desta terapia envolvendo bloqueio de citocinas ou de mediadores que têm papel fundamental na patogênese da dermatite atópica.
Dupilumabe é o primeiro imunobiológico aprovado para uso clínico pelo US Food and Drug Administration (FDA), pelo European Medicines Agency (EMA) e pela Anvisa para tratamento da dermatite atópica em pacientes com dermatite atópica moderada a grave e que não estão bem controlados com as terapias usuais. Estes imunobiológicos como o Dupilumabe são um tratamento promissor para a dermatite atópica, pois oferecem um tipo de tratamento que requer menos monitoramento laboratorial do que as terapias sistêmicas, além de apresentarem menores efeitos colaterais. Recentemente foi liberado para crianças maiores de 6 anos de idade.
Na última década o emprego da imunoterapia alérgeno específica passou a ser estratégia terapêutica relevante para o tratamento da dermatite atópica que tenha sua relação causal comprovada com ácaros da poeira domiciliar (Dermatophagoides pteronyssinus, Dermatophagoides farinae e Blomia tropicalis). O mesmo mecanismo de ação da imunoterapia que foi comprovado no tratamento da rinite e asma alérgicas se aplica à imunomodulação para tratamento da dermatite atópica. Apesar de existirem dados controversos na literatura sobre o uso de imunoterapia alérgeno específica para ácaros no tratamento da dermatite atópica, os dados mais recentes demonstram resultados que sugerem mais prós do que contras.
No entanto, não está indicado o tratamento com imunoterapia para alimentos no tratamento da dermatite atópica. O consenso preconiza que a imunoterapia para ácaros deve ser considerada para pacientes selecionados com dermatite atópica grave e sensibilização comprovada que têm história de piora clínica após a exposição ao alérgeno causador ou tenha um teste de adesivo atópico (patch test para ácaros) correspondente positivo.
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